terça-feira, 25 de outubro de 2011

EM TODAS AS COISAS EXISTE A MÚSICA DO CÉU

"Era uma vez uma Menina que tinha como seu melhor amigo um Pássaro Encantado. Ele era encantado por 2 razões. Primeiro, porque ele não vivia em gaiolas. Vivia solto. Vinha quando queria. Vinha porque amava. Segundo, porque sempre que voltava suas penas tinham cores diferentes, as cores dos lugares por onde tinha voado.



Certa vez voltou com penas imaculadamente brancas, e ele contou estórias de montanhas cobertas de neve.


Outra vez suas penas estavam vermelhas, e ele contou estórias de desertos incendiados pelo sol.


Era grande a felicidade quando eles estavam juntos.


Mas sempre chegava o momento quando o Pássaro dizia: ´Tenho de partir´


A menina chorava e implorava:´Por favor, não vá. Fico tão triste. Terei saudades. E vou chorar...` 


´Eu também terei saudades`, dizia o pássaro. ´Eu também vou chorar. Mas vou lhe contar um segredo: eu só sou encantado por causa da saudade. É a tristeza da saudade que faz com que as minhas penas fiquem mais bonitas. Se eu não for não haverá saudade. E eu deixarei de ser o Pássaro Encantado. Você deixará de me amar.`


E partia. A Menina, sozinha, chorava. E foi numa noite de saudade que ela teve uma ideia: ´Se o pássaro não puder partir, ele ficará. Se ele ficar, seremos felizes para sempre. E para ele não partir basta que eu o prenda numa gaiola.`  


 Assim aconteceu. A Menina comprou uma gaiola de prata, a mais linda. Quando o Pássaro voltou eles se abraçaram, ele contou estórias e adormeceu. A Menina, aproveitando-se do seu sono, o engaiolou. Quando o Pássaro acordou ele deu um grito de dor.


´Ah! Menina... Que é isso que você fez? Quebrou-se o encanto. Minhas penas ficarão feias e eu me esquecerei das estórias. Sem a saudade o amor irá embora...`


A menina não acreditou. Pensou que ele acabaria por se acostumar.


Mas não foi isso que aconteceu. Caíram as plumas e o penacho. Os vermelhos, os verdes e os azuis das penas transformaram-se num cinzento triste. E veio o silêncio: deixou de cantar. Também a menina se entristeceu. Não era aquele o pássaro que ela amava. E de noite chorava, pensando naquilo que havia feito ao  seu amigo...


Até que não mais aguentou. Abriu a porta da gaiola. ´Pode ir, Pássaro`, ela disse. ´Volte quando você quiser...`


´Obrigado, Menina`, disse o Pássaro. ´Irei e voltarei quando ficar encantado de novo. E você sabe: ficarei encantado de novo quando a saudade voltar dentro de mim e dentro de você...`.


A estória termina assim: a Menina na espera, se prepara para a volta do Pássaro. Mas como ela não sabia de onde ele voltaria, todos os espaços ficaram encantados: a qualquer momento ele poderia voltar. Quando a saudade apertava seu coraçãozinho, ela dizia: ´Que bom! Meu pássaro está ficando encantado de novo!` E assim, a cada noite ela ia para a cama triste de saudade mas feliz com o pensamento: ´Quem sabe ele voltará amanhã...`E sonhava com a alegria do reencontro.



Só voam aqueles que têm coragem para enfrentar a solidão: a solidão é amedrontadora. Albert Camus me contou que viagem boa é aquela que a gente faz com medo. Nós, humanos, somos estranhas criaturas: gostamos de ter medo. Escalamos montanhas, pendurados nos abismos; lançamo-nos no espaço vazio, confiados em frágeis asas; mergulhamos nas funduras do mar, cercados de perigos. Assim também as viagens- para serem mais que deslocamentos banais no espaço têm de ser saltos no desconhecido, com todos os seus calafrios... Coragem não é ausência do medo. É lançar-se, a despeito do medo.









´Voa! Terei saudades. Mas sei que são as saudades que nos tornam criaturas encantadas..."


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