sábado, 10 de setembro de 2011

PLANO DE VIAGEM


O pequeno barco de velas brancas
Rubem Alves

A vida é assim mesmo. É sempre possível deixar o barco atracado ou só navegar nas baías mansas. Aí não há perigo de naufrágio. Mas não há o prazer do calafrio e do desconhecido.

Segundo o taoísmo, a vida é assim: somos pequenos barcos de velas brancas no mar desconhecido. Os remos são inúteis. A força dos elementos é maior que a nossa força. Gosto de ver os urubus voando nos prenúcios de tempestade. Eles não batem asas. Não lutam contra o vento. Flutuam, deixam-se levar.

A sabedoria dos barcos a vela é a mesma sabedoria dos urubus. Brincar com vento e onda, vela e leme, e deixarmo-nos ser levados. A sabedoria suprema não é fazer- remar-, mas fazer nada, deixar-se levar pelo mar da vida que é mais forte. Eu nunca consegui chegar a lugar algum usando remos. Sempre fui levado por uma força mais forte que minha razão a praias com que nunca havia sonhado.

Foi assim que me tornei escritor, porque o mar foi mais forte que o meu plano de viagem.

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